segunda-feira, 11 de maio de 2009

Sobre Botecos


(copiado na caruda do site do yahoo)

Alguns acham que bastam algumas mesas de lata, fotos antigas nas paredes e o tradicional torresminho para compor um bom boteco. Outros acreditam que independente da decoração, o que conta é o dono atrás do balcão, preparando o bolinho de bacalhau e controlando a temperatura da cerveja. Afinal, qual é a cara desses pequenos bares tradicionais, que munidos apenas de petiscos caseiros e cervejas geladas, continuam fazendo frente aos lounges descolados e casas sofisticadas?

Armazéns e botecos

Vamos começar pela origem da coisa. A palavra boteco é derivada de "botica", lugares onde se vendia de tudo um pouco no começo do século passado. Era lá que se faziam compras rápidas, colocava-se os assuntos em dia e eram servidos aperitivos e bebidas aos fregueses. Como os bares não eram tidos como locais para "homens de família", as boticas logo se transformaram em um ponto de encontro (dando origem à história do cara que sai para comprar o pão e volta três horas depois). Daí vem o primeiro mandamento do boteco original: deverás ter armários e prateleiras carregados de garrafas, latas e compotas, junto a inúmeros tipos de cachaça e cerveja.

Extensão do lar

Na visão de Eduardo Maya, idealizador do concurso mineiro Comida di Buteco, o que define um estabelecimento autêntico vai bem além do cardápio e da cerveja de garrafa. "Ele é um lugar onde toda a família está envolvida, diferente do bar de empresários, que administram vários pontos sem botar a mão na massa. Com boa comida, tira-gosto e descontração, o boteco pode acabar se tornando uma extensão da casa", enfatiza Maya, que já promoveu a competição de petiscos autênticos em outros estados, como Paraná, Bahia, Goiás e Rio de Janeiro.
Foi nesse espírito, que em 1962, Luiz Nozoie montou um bar com o seu nome, no bairro da Saúde, em São Paulo. Lá todos os funcionários são seus parentes. "Quem frequenta gosta dos nossos pasteis e do prato de frutos do mar à vinagrete, servido sempre com uma cerveja gelada na salmoura, em uma sorveteria antiga", afirma Márcia Nozoie, filha de Seu Luiz. Além disso, é possível pedir porções mais inusitadas, como a de tempurás ou rãs empanadas. Afinal de contas, boteco que se preze tem que ter seus carros-chefe no cardápio de petiscos.

Gastronomia

Mas é bom lembrar que a gastronomia de boteco não se resume às porções. Um risca-faca que se preze tem que ter uma bela seleção de PFs todas as horas do dia. São refeições simples, de comida caseira, servidas com acompanhamentos tradicionais, como arroz, feijão, ovo e verduras. "Discordo de quem classifica isso como baixa gastronomia. Tudo é baseado em uma comida de raiz, que nasce dentro da nossa casa e vai para a rua, diferente da culinária de restaurante, que a gente come na rua e tenta imitar em casa", aponta Eduardo.

Assim como nos petiscos, um boteco de respeito deve ter seu prato de assinatura, como o Bar do Biu, localizado em Pinheiros, São Paulo, conhecido pelo "Mulatinha Assanhada", que leva carne de panela com farofa de feijão, acompanhado por uma boa seleção de cachaças e cerveja gelada. O segredo do sucesso da receita, assim como tudo no bar, é acompanhar o processo de perto, como explica o proprietário Rogério Gomes da Silva. "Basta oferecer uma boa diversidade de cerveja e cachaças. Mas o mais importante é ficar sempre em cima, se não o bar não tem a sua cara".

O original

Botecos estão na moda e abrem aos montes. Pelo menos é o que parece. Mas o que se vê atualmente são muitas casas travestidas, que na realidade não passam de lanchonetes e bares comerciais, como explica o chef Luiz Spagnolli, estudioso do assunto. "Não existe mais a preocupação de proporcionar bem estar ao cliente para que ele goste de ficar no boteco. Fomos invadidos por bares que tem como única finalidade ganhar dinheiro, e deixam de lado os amendoins e as conservas para dar lugar aos risoles congelados e esfihas de frango com catupiri".

A verdade é que sem os azulejos portugueses, balcões de alumínio e piso de ladrilho, os botecos mudaram bastante do século passado para cá. Mas ainda há espaço para resistência e para quem quiser conhecer a verdadeira vocação de um, não é preciso ir muito longe. Basta procurar um lugar com três itens fundamentais: mesinhas e cadeiras simples, cerveja gelada no copo americano e um petisco tradicional para acompanhar a conversa com os amigos. O resto é frescura.


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